Todo
relacionamento tende a falhar. Essa afirmação
parece cruel, até mesmo falsa. Contudo, toda convivência
a dois é humanamente forçada a compartilhar
as águas e flutuar nas marés da sociedade que
criamos. O modelo resultante da estrutura baseada em “dinheiro
e poder” obriga uma batalha constante entre o ego e
a essência humanos.
No meio do fogo cruzado dessa batalha, algumas vezes tranqüilo
durante as eventuais tréguas, encontramos o assustado
“relacionamento”.
O verdadeiro amor, sem qualquer ligação com
nenhum dos interesses do ego, é o que chamamos no dia-a-dia
de “utópico”. Praticamente impossível
no nosso ambiente civilizado.
Na prática, o que interpretamos e chamamos de “amor”
pode parecer até perfeito por algum tempo.
Sempre começa em uma grande paixão, porém,
mais cedo ou mais tarde, se transformará em ondas,
intensas ou não, de alegrias e prazer alternados por
ciclos de discussões, conflitos de interesses (do ego),
insatisfação, frustração, ataques
emocionais e até violência. É como se
todo aquele “amor” se transformasse, de uma hora
para outra, em ódio. Mais ainda, um ódio na
mesma intensidade do grande amor que há segundos transbordava.
Quando resolvidos, ou engolidos, os problemas do ego que geraram
a transformação, vem a reconciliação,
como em uma ação de acender e apagar uma lâmpada,
aflorando novamente todo aquele sentimento de “amor”.
Com o passar do tempo, nos relacionamentos mais duráveis,
essa oscilação estranha entre amor e ódio
acaba tornando-se normal, até “saudável”,
na interpretação “inteligente” da
nossa mente, e nas condições da nossa sociedade
do ego.
Será que isso é normal, realmente?
Alguns casais chegam a se tornar viciados nesse tipo de comportamento
oscilatório. Isso, de alguma forma, faz com que se
sintam mais “vivos”.
O problema é que a freqüência dos ciclos
negativos tende a crescer com o tempo. Por quê?
Ocorre que, no retorno de cada ciclo negativo temos um tipo
de “histerese”, que surge do acúmulo da
dor emocional dos ciclos anteriores. Isto é, quando
não resolvida totalmente (e nunca é nesses casos),
a dor de um ciclo negativo do passado se transforma em raiva
“sem sentido lógico no presente momento”.
Assim, é preciso uma razão, um “motivo
lógico” no presente para justificar a tentativa
de descarga daquela tensão antiga, aquela raiva do
passado, que no dia de hoje só faz sentido para a própria
pessoa. Por essa razão, quanto mais ciclos negativos,
maior a tendência de uma pessoa “explodir”
por pequenas provocações do seu ego. Na verdade,
não é exatamente o evento atual que “disparou”
toda a reação, mas a sua interpretação
contaminada e amplificada pelas dores acumuladas do passado,
mesmo aquelas geradas completamente fora do relacionamento!
Assim, no final, todo relacionamento tende a falhar ou a criar
um ego mutilado.
Nesse ponto, alguém poderia pensar: “E se eliminarmos
essa oscilação?”
O problema é que essa oscilação é
inerente a raiz do relacionamento. Isto é, o ciclo
negativo sempre vai existir como uma resposta natural da existência
do ciclo positivo. Ficou profundo, não ficou?
Na verdade os ciclos não são o verdadeiro problema,
eles são apenas conseqüências. O verdadeiro
problema é que a interpretação do sentimento
de “amor”. Ele sempre surge em sua forma pura
quando encontramos “aquela pessoa”, que nasceu
em hora e lugar diferentes no mundo, mas foi feita exatamente
da mesma “forma espiritual”, e “nos completa”.
Contudo, a partir desse sentimento puro, a interpretação
mental torna-se contaminada pelos interesses do ego “aperfeiçoado”
pelas bases do comportamento social estruturado em dinheiro
e poder.
Não é fácil essa constatação.
Afinal, todos “querem” ser boas criaturas e viver
a pura essência divina.
Porém, pare por um momento, afaste-se de você
mesmo e reflita sobre as causas dos problemas de relacionamento
que você já teve na vida. Pense também
em todos os outros casos possíveis: ciúmes,
sentimento de posse, controle, traição, acúmulo
de mágoas, necessidade de “estar certo”,
a conta bancária, insensibilidade com os seus sentimentos,
desinteresse, distância, manipulação,
necessidade de “descontar” em alguém, críticas,
competição, julgamento, vingança, violência,
etc. Note que, de uma forma ou de outra, todos eles sempre
podem ser relacionados com a falta, ou o medo da falta, de
dinheiro ou poder. Todos são relacionados com o ego.
Quando essas coisas acontecem, é comum vermos o ódio
tomar o lugar do “amor”, pelo menos na “interpretação
mental” desses sentimentos.
Isto é, como ambos são apenas interpretações,
ou “criações”, da própria
mente, um simples pensamento negativo, ampliado pela criatividade
e pelas crenças irracionais do passado, pode transformar
aquela pessoa maravilhosa, única, adorada, que você
“não podia viver sem”, no alvo de toda
a sua raiva, todo o seu ódio. Lógico que, uma
pessoa sadia emocionalmente irá controlar todo esse
sentimento. Essa é a situação normal.
Mas, em alguns casos, pessoas desequilibradas levam esse sentimento
às vias da violência, à tragédia.
Fato triste, lamentável, terrível!
Seria real esse amor, criado pela mente para satisfazer o
próprio ego, e que em um piscar de olhos se transforma
em ódio? Seria isso o verdadeiro amor? Ou o verdadeiro
significado de amar ficou esquecido, bem lá no fundo
da essência humana, coberto por inúmeras exigências
do ego que nunca se satisfaz?
O verdadeiro amor não duvida, não cobra, não
fere, não mata!
Você já sentiu, completa e honestamente, esse
amor?
|